Professor de universidade é afastado após chamar alunas para transar; Veja a conversa

A Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Bauru (SP) afastou na manhã desta quarta-feira (6) o professor denunciado por alunas pela prática de assédio sexual. A decisão foi oficializada através de notificação emitida pelo setor de RH da universidade.

A oficialização do afastamento do professor Marcelo Magalhães Bulhões, do departamento de Ciências Humanas, acompanha recomendação feita pela Comissão de Sindicância aberta pela universidade na última segunda-feira (4) para investigar conduta de professor após denúncias de assédio sexual.

O caso teve início depois de cartazes expostos no campus na última sexta-feira (1º) revelarem supostos assédios praticados por Bulhões. Os cartazes mostravam mensagens que supostamente teriam sido enviadas pelo professor. Uma delas diz: “a verdade é que nosso desejo não a”.

O afastamento preventivo do professor é pelo prazo de 180 dias, prorrogáveis uma única vez por igual período, sem prejuízo de vencimentos ou vantagens, segundo determina a legislação.

O despacho com a decisão do afastamento foi enviado por e-mail e também ao sistema interno que o professor a. Consultado pelo g1, o professor Marcelo Bulhões nega as acusações. (Confira a íntegra na nota abaixo)

De acordo com a Comissão de Sindicância, a decisão pelo afastamento foi decidida após ampla discussão sobre os fatos e avaliação dos documentos que instruem o processo.

Foto: Reprodução

Segundo a diretora da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (FAAC) e presidente do grupo istrativo do campus, Fernanda Henriques, o afastamento visa permitir a livre investigação do caso e também garantir ao professor o direito ao contraditório e ao princípio de presunção de inocência.

A comissão também pediu para que o departamento dos cursos ministrados pelo professor autorizem uma reunião com os alunos a fim de elucidar sobre os procedimentos tomados até então.

A Unesp ainda relembrou que a formalização de denúncias pode ser feita pela Ouvidoria, com garantia do anonimato para evitar a exposição das vítimas. Entre as medidas tomadas até então pela Unesp estão as ações de combate à violência e ao assédio:

Manifestações

Uma aluna, que preferiu não se identificar, participou da manifestação contra a conduta do professor que começou às 19h e durou cerca de duas horas na última sexta-feira. Durante todo o período, segundo ela contou, os estudantes ocuparam vários espaços do campus.

Começamos em frente à sala que ele daria aula na sexta-feira, na FAAC. Algumas alunas se pronunciaram junto ao movimento estudantil e ao movimento feminista. Tivemos alguns depoimentos de ex-graduandos, inclusive uma de 2013 que falou que aquilo já acontecia“, lembrou.

Depois, a aluna comentou que os alunos seguiram em direção à Faculdade de Engenharia de Bauru (FEB), ainda dentro da universidade, para convidar mais estudantes para o manifesto. A estudante lembra que gritavam frases como “assédio aqui não”.

O corredor todo cheio, estimo cerca de 100 a 200 pessoas. Tem muita gente ciente disso. O que a gente mais ouviu das falas são meninas que lembram que, no primeiro dia de aula, foram avisadas para tomar cuidado com o professor Marcelo Bulhões”, ressalta.

Para a aluna, é revoltante saber que o professor já esteve impune de outras acusações e processos instaurados na Unesp (relembre abaixo).

Nas aulas, ele sempre teve falas de conotação sexual. Ele aborda o audiovisual e, às vezes, ouvimos ele falar ‘nem posso ver essa cena que me dá gatilho’ ou então ‘essa cena é muito quente’. Então, em algumas aulas, as meninas, com medo, sentavam ao fundo e os meninos à frente. Esse desconforto já foi ado para o conselho do curso. E continuamos pressionando para que um novo processo seja aberto“, pontuou.

Para a estudante, manifestações como esta são de suma importância para reforçar que abusos e assédios sexuais não devem ser tolerados. Conforme ela disse, a universidade deveria ser um local seguro, já que muitos batalharam para estudar ali.

Não devíamos ter medo de ter aula. É principalmente mostrar que temos muita força como estudante, somos mais de seis mil na Unesp de Bauru. Nós temos voz, o movimento estudantil nunca parou e precisa cada vez mais engajar. Não podemos aceitar que isso aconteça“, finaliza.
A aluna confirmou que foi aberta uma petição com um pedido de exoneração do professor. No começo do protesto, segundo ela, eram 2.800 s e, até as 11h de sábado (2), a petição já contava com mais de cinco mil.

Denúncias

Essa não é a primeira vez que o professor Marcelo Bulhões é denunciado por assédio. Em 2017, segundo a Unesp, foi instaurada uma apuração preliminar na instituição para investigar as denúncias de assédio contra o docente.

Como procedimento, foi instaurada uma sindicância istrativa, finalizada em 2018. Ainda de acordo com a Unesp, uma comissão sindicante, à época, indicou o arquivamento dos autos com recomendações, tais como instauração de mecanismos para fomentar medidas educativas e elucidativas sobre assédio.

A FAAC defende a dignidade humana e é pautada por princípios que visam garantir o respeito e convívio harmônico em quaisquer circunstâncias e locais, especialmente em sua ambiência acadêmico-laboral. Nesse sentido, afirma que não medirá esforços para colaborar com as soluções de qualquer fato oficialmente demandado, tomando as medidas cabíveis, seguindo os protocolos istrativos com ética, responsabilidade e transparência“, informou a nota técnica.

Nota de posicionamento de Marcelo Bulhões na íntegra:

Foi com estarrecimento que fiquei sabendo que cartazes falsos, forjados, foram afixados no campus com teor acusatório a mim. Estou ainda chocado. De modo semelhante, foi com enorme e desagradável surpresa que em 2019, em postagem no Facebook, recebi uma acusação de assédio. Naquela altura, ao tomar conhecimento que um coletivo da Unesp havia feito acusações com esse teor, solicitei uma reunião com o grupo de alunas. Elas recusaram o diálogo. Solicitei essa reunião por, naquela altura, estar totalmente perplexo diante das acusações. Uma comissão de sindicância foi, então, constituída pela FAAC – Unesp. Após um processo de investigação, o arquivamento do processo se fez precisamente por afiançar que nenhuma ação do teor de assédio foi por mim cometida. No curso do processo, aliás, recebi depoimentos de incondicional apoio e elogio ao meu profissionalismo, escrito por dezenas de alunas que foram minhas orientandas (mestrado, doutorado e iniciação científica). Portanto, só posso afirmar que estou absolutamente estarrecido diante de uma situação que julgo absurda. Os cartazes, aliás, foram anonimamente forjados e afixados no campus. Sou docente da Unesp desde 1994, ou seja, trata-se de 28 anos de trabalho em sala de aula, tendo atuado ao lado de milhares de alunos, sem que qualquer mínimo indício concreto do que se pode ser classificado como assédio possa ser apontado. Atingem-me do modo mais vil. Entendo que legítimas e importantes demandas da atualidade – luta contra o racismo, movimento feminista – têm produzido uma mobilização de empatia diante de causas de enorme relevo. Nesse caso, todavia, estou sendo vítima de calúnia, cuja propagação em tempos digitais é implacável.”

Primeiros protestos

Ainda em 2018, as alunas da FAAC fizeram um protesto durante a cerimônia de formatura dos cursos de jornalismo, relações públicas e rádio e TV. Ao final do discurso do orador, elas levantaram cartazes em que pediram o fim do assédio na universidade referente ao mesmo professor.

Os cartazes traziam dizeres como “Unesp sem assédio“, “FAAC sem assédio“, “Alunas livres de assédio” e “Quero aula, não assédio“. Em nota à imprensa, a Unesp afirmou que existia uma denúncia sobre o professor que estava “em processo de apuração“.

À época, a página de um coletivo feminista da Unesp no Facebook destacou o protesto, realizado durante a cerimônia no dia 8 de março, Dia da Mulher, daquele ano.

Na postagem, o coletivo feminista afirmou que os canais de denúncias formais são pouco divulgados e que a apuração das denúncias é feita de forma lenta.

Queremos melhorias nos canais de denúncia e no acolhimento de vítimas. Queremos investigações feitas com seriedade e cuidado. Queremos uma punição eficaz dos julgados culpados. Queremos um ambiente em que todas as pessoas possam falar abertamente do que sofreram sem medo de represálias. Queremos campanhas de prevenção e conscientização dos professores. Queremos um ambiente seguro para estudar.

Via G1

Veja também
Recentes